quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Mulheres do século 21, como vocês caíram nessa?



Por Rogério Marques


Nada melhor do que papo de botequim para discutir, sem meias-palavras, temas considerados polêmicos - principalmente depois do segundo chope. Há poucos dias, no aniversário da minha amiga Beth, eu era um dos dois homens numa mesa de cinco mulheres. Lá pelas tantas a Júlia mandou esta: "Nos últimos 30 anos a mulher avançou muito nos costumes e deixou o homem para trás, desconcertado, sem saber como lidar com a 'nova mulher'". Talvez eu devesse ter ficado calado, mas achei de dizer que a "nova mulher" deu realmente deu um grande passo à frente... e outro atrás.

Em meio a protestos, tentei me fazer explicar: a mulher avançou, e muito, no direito à igualdade com os homens no campo profissional, nas artes, na cultura em geral, na liberdade sexual - em tudo a que tem direito. Até hoje muito homem não sabe como lidar com esta nova realidade, como bem disse a Júlia. Mas se a mulher avançou nesse campo, em outro recuou feio. Tornou-se escrava da necessidade da sedução, da vaidade exacerbada, da ditadura do corpo, da "beleza" a qualquer preço. Essa é a grande contradição vivida pela mulher no início do século 21. Ela caiu numa armadilha que ela própria ajudou a armar.

Vejo amigas no auge dos 30 anos, em pleno viço, mas que se acham eternamente gordas, "barangas" e se submetem aos mais absurdos sacrifícios, torrando grana para ficar magras e... "bonitas". É academia, é massagem, são remédios, lipoaspiração, botox, cirurgia plástica. Lembram do "alisamento japonês", que exigia horas na cadeira do cabeleireiro e fez algumas ficarem quase carecas? E as injeções de Lipostabil, que prometiam queimar gordura sem lipoaspiração? Foram proibidas pela Vigilância Sanitária porque não existem estudos clínicos que garantam a segurança do produto. O "milagre" durou pouco - e quem apostou nas injeções tem que torcer agora para não enfrentar problemas de saúde no futuro.

A indústria da "beleza", os maus médicos e certa imprensa ajudam a "nova mulher" a se atolar mais e mais nesse pântano. De vez em quando uma delas entra em coma ou morre na mesa de cirurgia. Afinal, o nome da mesa já diz tudo: é de cirurgia, e cirurgia implica riscos que são omitidos pela turma que lucra com isso. Tenta-se passar a idéia de que é possível trocar de peito como quem troca de blusa. De que se pode perder litros de gordura como quem esvazia a bexiga. E de que só as "popozudas" têm direito ao reino do céu. Pobre da adolescente com pouca bunda nos dias de hoje. Vai ter que fazer muita terapia para aceitar o "fracasso", ou então terá que botar uma prótese de silicone. A coisa é tão grave que qualquer dia o SUS vai ter que bancar a cirurgia para as pobres coitadas.

Os sacrifícios para ficar "bonita" se estendem ao guarda-roupa. "Provocar" é preciso, por mais erótico, desconfortável e ridículo que seja o modelito. Há algum tempo a onda era uma saia justa de malha que ia subindo conforme a moçoila caminhava. A cada cinco, seis passos era preciso puxar a saia para baixo, simulando um certo pudor. Mais recentemente veio a cintura baixa das saias e calças, complementadas com uma blusinha esperta que também precisa ser puxada para baixo de vez em quando, de preferência quando um marmanjo bota o olho.

Qualquer homem sabe que nada há de mais incômodo que cueca apertada, "entrando". Mas a "nova mulher" se submete docilmente ao sacrifício: além da calcinha cavadíssima, a calça comprida e o shortinho têm que ser superapertados, com o gancho supercavado, dividindo a "nova mulher" ao meio, lá embaixo, de um lado a outro. Afinal, realçar o bumbum é fundamental. A calça jeans de algodão não era bastante, e surgiu o jeans-lycra. Ainda era pouco, e a solução foi desbotar as partes "principais". O salto alto, igualmente desconfortável, causador de tombos e entorses, virou brincadeira de criança. Por falar em criança, é de cedo que se começa. A moda "provocante" já é seguida à risca pelas garotinhas de cinco, seis anos na escalada da erotização precoce, para alegria dos pedófilos. Até o bumbum tem que estar arrebitado, ainda que às custas de uma futura escoliose.

O que mais me impressiona nessa história é ver mulheres bonitas, gostosas e inteligentíssimas caindo nessa esparrela, escravas de padrões estéticos e tão submissas a esses padrões como se submetiam aos homens, tempos atrás. Algumas acham mesmo que isso é avançadíssimo, sem saber que estão mergulhando na mais absoluta caretice. Felizmente, como em toda regra, nessa também existem exceções. E que fique bem claro: erotismo é bom e eu gosto. Mas daí a se transformar a vida num eterno jogo para a platéia do sexo oposto é amesquinhar a própria existência.

Dá pra ver que lá pelas tantas o papo esquentou na mesa das cinco mulheres, no aniversário da Beth. Até porque consegui o apoio ao menos parcial de duas delas. Na verdade, gostaria de convencer não só às minhas amigas, mas a todas as brasileiras de bom senso e boa cabeça: é preciso começar uma nova revolução como aquela dos anos 60, agora não mais contra a ditadura do macho. Desta vez é preciso lutar contra a ditadura da caretice e da submissão a uma estética preconceituosa e excludente que a própria mulher moderna ajudou a criar, e da qual não sabe como se libertar.